Rodas, pra que te quero!

8 Tchela achou uma ideia maluca. Quando já se viu tamanha maluquice? Dar um presente e dizer que não pode abrir o presente? Eu, hein! Mas a caixa era bonita, e Tchela estava tão feliz em voltar pra casa que aceitou a maluquice sem maiores perguntas. Como agora era um momento de tomada de decisões, Tchela olhou para o presente. Que segredo ele guardava? Quando seria o momento de abrir a caixa? Seria agora, em que as de- cisões estavam sendo tomadas? Não, agora era hora de perguntas, e não de certezas, era hora de mudança. Sua irmã Carô foi quem não gostou da ideia. Ela já andava danada da vida, pois, desde que as pernas de Tchela desistiram de caminhar, Carô tinha de varrer o quarto sozinha, arrumar tudo sozinha. E ela detestava arrumar o quarto e varrer! Em geral, dava um jeito de fugir e deixar pra Tchela a varrição.Tchela gostava de varrer. Gostava de ver a poeira fina sair do brilho do assoalho, e o assoalho ter seu rosto. Mas agora, por uns tempos, não podia, tinha que gastar pouca energia e se alimentar bem. E essa era outra coisa que sua irmã invejava, pois a lata amarela cheia da gostosa e doce farinha láctea era só para Tchela. Mas Carô dava um jeito de subir no banco, sem ninguém ver, e roubar uma colherada de farinha e enfiar tudo na boca. E deixar a farinha grudada no céu da boca! Carô dizia: — Agora é tudo Tchela, Tchela, Tchela… parece até que eu não existo! — Existe tanto, minha filha, que agora você vai ser a mocinha que sempre disse ser. Por enquanto Tchela não pode mais lavar louça nem varrer, mas você, como é mocinha, pode. — Então, mãe, você deixa eu usar batom? Afinal, agora sou mocinha! Tchela viu que a mãe segurou um sorriso. Poxa, fazia tanto tempo desde a última vez que vira sua mãe sorrir! Agora Tchela notou que o sorriso de sua mãe fazia falta. Sua mãe segurou o sorriso como se fosse um passarinho que fugia da gaiola, colocando-o de volta, mas dava pra ver entre as grades: — Batom, hein? —murmurou a mãe e completou:—Vou pensar no assunto.