Ana Z., aonde vai você?

17 Hesita. Abaixa o queixo no peito. Depois levanta a cabeça e, numa arrancada, libera o tornozelo: —Dá uma escama pra mim? O mineiro para, descon ado. — Pra quê? —De lembrança. —Não posso. Mesmo. Aqui não se desperdiça nada. Não se tira nada que não se vai usar. — Desperdício coisa nenhuma! Quem disse que não vou usar? Lembrança é muito mais útil que escama. Vou usar a vida toda. Juro. — Jura? Que bonito o sorriso do mineiro! Ele se abaixa, abre uma caixa de ferro tão escura quanto a pedra, cheia de gavetinhas. Abre uma gavetinha. Estende a mão para Ana. Na palma, um brilho quase transparente, uma agulhada de ouro. — Cuidado para não perder. É escama de rabo de lhote. Uma coisa ainda prende Ana. Um desejo mais. Já que vai atrás dos peixes, será que o mineiro não teria outra lâmpada, igual à dele, para lhe emprestar? É pedir muito, ela sabe, mas não vai de- morar, já já volta, e seria tão mais fácil com aquela luz. O mineiro, que ca sempre ali sozinho, anos a o sem conver- sar com ninguém, já se sente amigo de Ana, quase íntimo. E por que não emprestaria uma lâmpada a uma amiga íntima? Assim, capacete luminoso na cabeça, escama de lhote no bol- so, Ana se despede, e segue caminho. Aos poucos, tac, tac, o ruído, que recomeçou, esmaece, vai - cando para trás. 5 Este lugar é de morte E já não se ouve, quando Ana nota que o teto está cando cada vez mais baixo, as paredes cada vez mais próximas. Tão baixo e

RkJQdWJsaXNoZXIy NzM0MDA=