Contos de enganar a morte

O homem que enxergava a morte — Médico? Eu? — perguntou o sujeito, espantado. — Mas eu de medicina não entendo nada! — Preste atenção — disse ela. Mandou o homem voltar para casa e colocar uma placa dizendo-se médico. Daquele dia em diante, caso fosse cha- mado para examinar algum doente, se visse a figura dela, a figura da Morte, na cabeceira da cama, isso seria sinal de que a pessoa ia ficar boa. — Em compensação — rosnou a Morte —, se me enxergar no pé da cama, pode ir chamando o coveiro, porque o doente logo, logo vai esticar as canelas. A Morte esclareceu ainda que seria invisível para as outras pessoas. — Daqui pra frente — concluiu a famigerada —, você vai ter o dom de conseguir enxergar a Morte cumprindo sua missão. Dito e feito. O homem colocou uma placa na frente de sua casa e logo apareceram as primeiras pessoas adoentadas. O tempo passava correndo feito um rio que ninguém vê. Enquanto isso, sua fama de médico começou a crescer. É que aquele médico não errava uma. O doente podia estar muito mal e já desenganado. Se ele dizia que ia viver, dali a pouco o doente estava curado. Em outros casos, às vezes a pessoa nem parecia muito enferma. O médico chegava, olhava, examinava, coçava o queixo e decretava: — Não tem jeito! E não tinha mesmo. Não demorava muito, a pessoa sen- tia-se mal, ficava pálida e batia as botas. 11

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